Especial Setembro roxo: Pesquisas sobre a Doença de Alzheimer
Em alusão ao mês Mundial da Doença de Alzheimer, o SUPERA preparou uma série de reportagens e entrevistas especiais sobre a saúde do Cérebro. Nesta entrevista vamos falar sobre as pesquisas com modelos animais na área da Doença de Alzheimer, quais são os avanços atuais e as perspectivas, com a participação da Profa. Dra. Tânia Araújo Viel, coordenadora Laboratório de Neurofarmacologia do Envelhecimento (LaNE) da Universidade de São Paulo.
1.Poderia apresentar o grupo de pesquisa LaNE? Quais foram as principais inquietações dos pesquisadores ao iniciarem os estudos com o gene humano mutado da APP em modelos animais?
Tânia Araújo Viel: O Laboratório de Neurofarmacologia do Envelhecimento é um grupo de pesquisa que reúne estudantes de diversos cursos de graduação e pós-graduação. Atualmente, é composto por um Pesquisador Colaborador, dois Pós-Doutorandos, uma estudante de Doutorado (em Farmacologia), duas de Mestrado (em Gerontologia) e três alunos do Curso de Graduação em Biotecnologia que fazem Iniciação Científica.
Utilizamos modelos animais e celulares para investigar o envelhecimento cerebral saudável e a doença de Alzheimer (DA). A partir desse contexto, em 2011 passamos a usar o modelo transgênico para a DA, por ser um modelo que desenvolve neurodegeneração a partir dos 10 meses de idade, mas tem perda de funcionalidade neuronal alguns meses antes. Esse é um modelo pouco agressivo para os animais, mimetizando o desenvolvimento lento da DA em humanos.
2. Como os achados deste (s) estudo (s) pode (m) refletir na pesquisa aplicada com seres humanos hoje?
Tânia Araújo Viel: Utilizamos esse modelo para estudar estratégias medicamentosas ou não para a neuroproteção e manutenção da memória. A partir desses dados, verificamos que é possível que seres humanos usufruam de algumas dessas estratégias para a melhora da sua qualidade de vida, como o enriquecimento ambiental (mudar a rotina, fazer atividade física, curso de dança, curso de línguas, etc), treino de atenção e consumo de chá da casca da romã. Para uma outra estratégia, o uso de carbonato de lítio em microdose, é recomendado o acompanhamento de um profissional médico.
3. A partir de que ponto pode-se fazer comparações dos resultados obtidos pelo grupo da pesquisa, com a perspectiva da vida e do desenvolvimento do ser humano?
Tânia Araújo Viel: Conforme colocado no ítem anterior, várias estratégias podem ser exploradas pelas pessoas de diferentes idades, sem a necessidade de acompanhamento médico (como o enriquecimento ambiental, por exemplo).
Para o tratamento com carbonato de lítio em microdose, já temos evidências de que o uso crônico (por mais de 3 meses) por adultos e idosos leva à manutenção da memória e neuroproteção.
4. Os ratos transgênicos, são os animais que mais possibilitam a observação dos resultados para o estudo da doença de Alzheimer?
Tânia Araújo Viel: Na verdade, utilizamos camundongos transgênicos. Esse é um bom modelo, mas sabemos hoje que há outras formas de se estudar a doença de Alzheimer.
Pesquisas sobre a Doença de Alzheimer: testes em animais
5. Já foram feitos testes em outros tipos de animais, além de ratos? Se sim, poderia citar algum outro exemplo?
Tânia Araújo Viel: Nosso grupo de pesquisa trabalha, também, com cães domésticos velhos, analisando o comportamento e avaliando marcadores biológicos no sangue dos animais. Os cães mais velhos podem desenvolver a Síndrome da Deficiência Cognitiva Canina, um estado comportamental muito semelhante à Doença de Alzheimer.
6. Quais limites éticos tem esse tipo de pesquisa com animais e doença de Alzheimer?
Tânia Araújo Viel: Os limites éticos são os mesmos para os estudos com seres humanos. Existe uma Comissão Nacional de Controle de Animais de Experimentação (CONCEA) que regulamenta todos os experimentos com animais, sejam de laboratório, silvestres, ou de proprietários. O cuidado ético deve ser exercido da mesma forma e o tratamento dever ser feito com o mesmo respeito.
Pesquisas sobre a Doença de Alzheimer
7. No decorrer do desenvolvimento dessa pesquisa quais os resultados prévios obtidos em relação aos fármacos associados a Doença de Alzheimer?
Tânia Araújo Viel: Temos resultados promissores que apontam para a redução da neuroinflamação, manutenção da densidade de neurônios e astrócitos e manutenção da funcionalidade e comunicação neuronal. De todas as formas, as estratégias devem ser feitas no longo prazo, sem a expectativa de uma cura imediata. A mudança no estilo de vida é fundamental para o sucesso da terapia farmacológica.
8. Com a observação dos ratos transgênicos, foi possível perceber resultados diferentes em relação ao sexo?
Tânia Araújo Viel: Com os animais transgênicos, a resposta comportamental e farmacológica foi muito semelhante, independente do sexo.
Em relação a Cor, foi possível perceber diferenças entre os ratos mais escuros ou mais claros?
Tânia Araújo Viel: Para a resposta farmacológica que estudamos, a cor dos animais é irrelevante.
9. Em relação a Irisina, que segundo estudiosos é um hormônio produzido endogenamente durante o exercício físico, quais os achados, considerações e os apontamentos a respeito dela?
Tânia Araújo Viel: Segundo trabalhos recentes, aparentemente a Irisina produzida nos músculos atravessa a barreia hematoencefálica e age em receptores específicos no sistema nervoso central, aumentando a liberação de neurotrofinas, como o BDNF (do inglês: “brain-derived neurotrophic fator”), promovendo neuroproteção e manutenção da memória a longo prazo, Sabe-se que idosos com DA possuem menor produção e ação da irisina. Dessa forma, a manutenção da atividade física em idosos é extremamente importante.
10. Existem estudos que apontam uma melhora significativa nas sinapses e um resgate de memória, de modo geral, com a presença de músicas com frequências sonoras específicas, como as músicas clássicas. Portanto, além do enriquecimento ambiental, já foram feitos testes com as frequências sonoras? Quais os achados?
Tânia Araújo Viel: apesar de já ter visto trabalhos com relação ao benefício da música para a manutenção da memória a longo prazo, não é do meu domínio os trabalhos relacionados às frequências sonoras.
11. Segundo alguns estudos, a diabetes mellitus pode ser um agravo para o diagnóstico futuro da doença de Alzheimer, nas pesquisas com modelos animais, foi possível observar alguma associação entre essas doenças?
Tânia Araújo Viel: Sim, quando falamos de pesquisas sobre a Doença de Alzheimer a DA tem sido considerada, por alguns estudiosos, como a “Diabetes tipo 3”. Na verdade, alguns trabalhos mostram que a insulina participa do processo de metabolização do peptídeo beta-amiloide insolúvel, que acumula ao longo do processo de envelhecimento, podendo contribuir para o desenvolvimento da DA. Em pacientes com resistência à insulina, a degradação do peptídeo fica prejudicada, promovendo a deposição e formação das placas senis. Isso permitiu a relação entre as doenças.
12. Juntos com o enriquecimento ambiental, foram testados diferentes dietas, entre grupo de animais, existem diferenças?
Tânia Araújo Viel: Já investigamos o jejum intermitente como estratégia para a manutenção do funcionamento do cérebro, com excelentes resultados relacionados à redução da neuroinflamação e à manutenção da memória. Existem mais de 3.000 trabalhos científicos mostrando os benefícios da redução calórica para a manutenção da funcionalidade do cérebro, manutenção dos parâmetros cardiovasculares ótimos e redução de marcadores para cânceres em pessoas que praticam a redução calórica ao longo do envelhecimento e na velhice.
Estudos publicados pelo grupo de pesquisa Laboratório de Neurofarmacologia do Envelhecimento (LaNE).
Entrevista com: Profa. Dra. Tânia Araújo Viel
Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP, 1995), mestrado em Farmacologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP, 1998) e doutorado em Farmacologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP, 2003). Atualmente é Professora Associada da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo e orientadora pelos Programas de Pós-graduação em Farmacologia (ICB/USP), Gerontologia (EACH/USP) e Bioquímica e Biologia Molecular (EACH/USP). Tem experiência na área de neurotransmissão colinérgica motora e central, com ênfase em: estratégias não-medicamentosas para melhora da função cognitiva, aspectos neuroquímicos da doença de Alzheimer e neuroplasticidade no processo de envelhecimento natural.
Entrevista conduzida por: Profa. Dra. Thais Bento Lima-Silva
Gerontóloga formada pela Universidade de São Paulo (USP). Docente do curso de Graduação em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), Coordenadora do curso de pós-graduação em Gerontologia da Faculdade Paulista de Serviço Social (FAPSS), pesquisadora do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG). Membro da diretoria da Associação Brasileira de Alzheimer- Regional São Paulo. É assessora científica e consultora do Método Supera.
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