Cérebro sociável
Um por todos e todos por um
Você acaba de entrar em uma loja e há dois vendedores no balcão. Um deles sorri largamente quando lhe vê enquanto o outro lhe observa, mas não esboçou nenhum sorriso e inclusive franziu levemente a testa. O vendedor sorridente diz um largo bom dia e o outro, apesar de não tirar os olhos de você, diz somente: “em que posso ajudá-lo?” Para qual deles você vai dirigir a palavra? Acho que já sei sua resposta, porém o que está por trás dela pode ser muito interessante se pararmos um minuto para analisar nossos comportamentos.
A receptividade dos dois vendedores atesta qual deles tem maior conhecimento técnico sobre o produto que você procura? O fato de um deles ser mais sorridente e receptivo faz com que você se sinta chamado a conversar com ele, mas será que sua escolha foi acertada? Deixe-me contar o que sei sobre estes dois: sem compromisso com nada, despreocupado com a vida, este vendedor que trabalha distribuindo sorrisos tem muito pouco preparo técnico sobre os produtos que vende. Enquanto isso, o outro passa o tempo do almoço lendo manuais técnicos para lhe atender melhor.
Como seus resultados não têm sido satisfatórios, o vendedor carrancudo quer saber o que ele deve fazer para ter os mesmos resultados do “boa-vida” aí do lado. Para ele, é estressante pensar que o colega que não estuda, fala coisas erradas sobre os produtos e usa até de enganação para vender mais consegue resultados melhores.
Ele já não sabe mais o que fazer para mudar esta situação. Tem ficado doente com frequência e já foi diagnosticado com sinais de ansiedade e depressão. Quanto ao vendedor sorridente, o gerente anda recebendo reclamações após as vendas, mas os resultados dele estão dentro do esperado. Se precisar demitir alguém não tem dúvida de que escolherá o problemático.
Mas, o que o vendedor precisa é desenvolver seu cérebro socioemocional, caso contrário, poderá perder seu emprego. Pergunte ao vendedor problemático o motivo para não ter clientes. E então ele dirá que tem muito azar. Este espírito de eterno perseguido é uma das razões para que ele não consiga se desligar um só minuto das suas preocupações pessoais. Quando o cliente entra na loja, ele está preocupado e franze a testa porque já está prevendo que o outro vendedor será escolhido. Desta forma, como ele vai conseguir criar empatia com o cliente e entender que um sorriso pode mudar tudo?
Precisamos aprender a observar os outros e se desligar das ideias fixas que fazemos de nós mesmos. O cérebro socioemocional é a porção cerebral que constrói, a partir das emoções, um campo frutífero para as relações sociais.
Vida em sociedade passa por comprometimento
Nosso sistema emocional não pode estar sequestrado em preocupações constantes sobre a sobrevivência emocional. Isto seria desastroso. E as relações sociais acabariam se tornando apenas um meio para a solução destas demandas que são exclusivamente pessoais. Não podemos olhar para uma pessoa como se ela fosse a salvação da nossa pátria. Isto faria com que as relações intrapessoais se tornassem extremamente pobres. Além disso, deixar o cérebro ficar sequestrado o tempo todo tentando resolver as mesmas coisas usando o mesmo tipo de pensamento, não vai ajudar em nada. A criatividade e a capacidade produtiva são inimigas destes ciclos viciosos emocionais.
Para desenvolver a inteligência social, é importante desligar-se daquela ladainha que se repete todo dia na sua mente e que é alimentada pela porção do sistema emocional que só se preocupa com a própria existência. Mas há outros elementos que precisam ser mudados nesta cena.
Precisamos aprender a reconhecer um sorriso verdadeiramente interessado e comprometido para não cairmos na arapuca do vendedor “boa-gente”. Precisamos chamar a atenção do gestor para que ele desenvolva ferramentas para desenvolver adequadamente seus funcionários. E vamos forçar o vendedor boa-vida a preocupar-se verdadeiramente com as pessoas que atende e não só dar sorrisos vazios e dissimulados.
Para a emancipação emocional do ser humano, nosso sistema emocional precisa evoluir e começar a tomar conta das relações sociais com a mesma força que as necessidades internas são cuidadas. E o mais importante é considerar que não vale ficar cuidando dos outros só com a intenção de que os outros cuidem de você.
Um aprendizado muito importante que a natureza revela através da evolução do cérebro dos mamíferos é que a vida em sociedade é mais do que apenas uma divisão de tarefas. É a forma pela qual aprendemos a nos comprometer com o todo para que o todo possa se comprometer com a gente.
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