É possível formar novos neurônios em pessoas analfabetas após o processo de alfabetização?
A neurogênese, ou seja, a capacidade do cérebro de formar novos neurônios, é um fenômeno fascinante que continua ao longo da vida adulta, especialmente no hipocampo, uma área vital para a memória e aprendizado (Eriksson et al., 1998). Embora geralmente associada à juventude, pesquisas recentes sugerem que certos estímulos e atividades podem promover a neurogênese mesmo em pessoas mais velhas (Pascual-Leone et al., 2005).
A alfabetização em pessoas idosas, que antes não sabiam ler nem escrever, é um exemplo intrigante desse potencial. Aprender a ler não apenas envolve adquirir novas habilidades, mas também cria um ambiente cerebral mais dinâmico e estimulante. Estudos indicam que o processo de aprendizagem pode aumentar a plasticidade cerebral, ou seja, a capacidade do cérebro de reorganizar suas conexões neuronais, e até mesmo estimular a formação de novos neurônios (Stern, 2012).
Além disso, o ambiente enriquecido proporcionado pela educação pode ter efeitos duradouros na saúde cerebral. Pascual-Leone e colaboradores (2005) demonstraram que adultos engajados em atividades intelectualmente desafiadoras, como aprender novos idiomas ou desenvolver habilidades técnicas, frequentemente mostram melhorias significativas na função cognitiva e na saúde do cérebro em geral.
Ademais, o estudo intitulado “Episodic memory improvement in illiterate adults attending late-life education irrespective of low socioeconomic status: insights from the PROAME study.” (Ruppert et. al., 2024), por exemplo, explorou a relação entre status socioeconômico (SES) e aprendizado em uma amostra de adultos analfabetos e encontrou melhorias significativas na memória episódica e habilidades de leitura através da educação básica na vida adulta, destacando que a educação tardia pode ser uma
medida preventiva não farmacológica importante, especialmente em países de baixa e média renda. Esses achados sugerem que a educação, mesmo em idade avançada, pode promover a plasticidade cerebral e, potencialmente, a neurogênese.
Embora mais pesquisas sejam necessárias para compreender completamente os mecanismos e o impacto da alfabetização na neurogênese em pessoas idosas analfabetas, os dados atuais indicam que a alfabetização pode ser uma poderosa ferramenta para estimular o cérebro ao longo da vida. Investir em educação contínua não apenas enriquece o conhecimento e as habilidades individuais, mas também
fortalece a base neural do cérebro.
Profa. Dra. Thais Bento Lima-Silva
Gerontóloga formada pela Universidade de São Paulo (USP). Docente do curso de Bacharelado e do Programa de Mestrado em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), pesquisadora do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG).
Membro da diretoria da Associação Brasileira de Alzheimer- Regional São Paulo, parceria científica do Instituto Supera de Educação.
Maria Antônia Antunes de Souza
Graduanda em Gerontologia pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). Foi bolsista de iniciação científica PUB do projeto intervenções psicoeducativas para a COVID-19 aliada à estimulação cognitiva no programa USP 60 + e atualmente é membro do Grupo de Estudos em Treino Cognitivo da USP (GETCUSP).
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