Por que nosso cérebro se desconecta quando dormimos?
À medida que o sono chega, nos desconectamos da realidade. Nossa consciência do ambiente que nos cerca vai ficando cada vez menor enquanto nossas sensações vão enfraquecendo, até que passamos “do outro lado”. O cientista Thomas Andrillon e seus colegas estudaram esta perda de contato progressiva e tentaram entender porque o cérebro se isola desta forma durante o sono.
O sono se caracteriza por uma perda de reatividade comportamental. Até pouco tempo atrás, os cientistas não conseguiam determinar de forma clara como a atividade dos neurônios podia limitar a capacidade de tratar a informação sensorial durante o sono. Para estudar esta desconexão do cérebro, uma equipe de neurocientistas do Departamento de Estudos Cognitivos, da ENS (Escola Normal Superior) de Paris, das Universidades Pierre e Marie Curie e Descartes e da Universidade Técnica da Dinamarca buscaram explorar a reatividade do cérebro durante o sono.
Para tanto, eles realizaram uma experiência com 23 pessoas de 21 a 31 anos (16 mulheres e sete homens), que foram orientadas a classificar palavras pouco antes de adormecerem. A atividade cerebral dos participantes foi registrada por meio de eletroencefalografia. Eles deviam apertar um botão localizado a sua esquerda se a palavra ouvida era um objeto, e outro à direita se era um animal. A listagem das palavras – 72 no total, igualmente divididas entre objetos e animais – continuava durante o sono dos participantes. De fato, mesmo que eles já não pudessem mais apertar os botões, os pesquisadores queriam verificar em que medida o cérebro ainda podia perceber e analisar de forma semântica as informações enviadas.
O estudo da atividade cerebral dos participantes mostrou que durante o sono lento leve (ou seja, a fase do adormecimento), o cérebro analisa o sentido das palavras e decide apertar no botão certo – mas sem emitir o comando motor. Em seguida, durante o sono lento profundo e o sono paradoxal, o traçado eletroencefalográfico não apresenta mais o pico característico de uma preparação à ação no nível do córtex motor, o que significa que a análise semântica das informações percebidas já não é mais tão elaborada. Entretanto, a equipe de Thomas Andrillon observou que as áreas que respondem pela análise física dos sons (intensidade, frequência,…) continuavam acesas, sem que sua atividade se propague ao resto do cérebro. Os pesquisadores isolaram então dois mecanismos diferentes segundo a fase do sono.
Durante o sono lento profundo, o córtex parece responder às palavras emitidas inibindo mais sua parte frontal, área essencial aos tratamentos complexos como compreensão e aplicação de comandos. Como demonstraram muitos estudos, esta fase de sono desempenha um papel crucial na consolidação da memória. O cérebro precisa, portanto, isolar-se do mundo exterior.
Ao contrário, durante o sono paradoxal, os cientistas observaram uma atividade cerebral semelhante à do despertar. Isso se explica, segundo eles, pela mobilização dos recursos para os sonhos, que são frequentes nesta fase. Assim, não restaria energia suficiente para analisar as informações auditivas externas, uma vez que estas não ultrapassam o córtex auditivo (local das análises rudimentares dos sons). Mais uma vez, o fato de o cérebro estar em “pausa vigilância” e “pausa reatividade” seria benéfico.
De acordo com os autores do estudo, o sono pode, assim, ser considerado como um procedimento autorregulado, durante o qual a informação externa pode ser tratada por etapas mais leves, e eliminada por etapas mais profundas. Tudo pelo bem estar do nosso cérebro.
Fonte: T. Andrillon et coll., Neural Markers of Responsiveness to the Environment in Human Sleep, in The Journal of Neuroscience, 15 junho de 2016
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