Não podemos entrar no tema sono sem antes pensar que; há um ritmo que se repete em nosso organismo que conhecido como ciclo vigília/sono. Esse processo gera a alternância entre estarmos dormindo e estarmos acordados e é influenciado por diversos hormônios, que também têm seus ritmos e seus horários de manifestação.
Um dos hormônios mais importantes para a qualidade do nosso sono é o cortisol, que está associado ao nosso estado de alerta, de prontidão. Outro hormônio essencial é a melatonina, que está associada ao nosso estado de repouso e relaxamento; além de estar intimamente ligado ao nosso sistema de memorização do aprendizado adquirido durante o dia.
Antes do amanhecer, a nossa glândula adrenal secreta uma maior quantidade do hormônio cortisol e prepara o organismo para a atividade do dia. Após o entardecer, a glândula pineal aumenta a secreção da melatonina, que sinaliza ao organismo que está anoitecendo. A melatonina desencadeia mudanças que preparam o organismo para o sono noturno.
Se medirmos a temperatura corporal a cada duas ou três horas ao longo de alguns dias, verificaremos que ela tende a atingir valores máximos no final da tarde e valores mínimos no meio da noite. Esse ritmo da temperatura acompanha a expressão desses hormônios e é uma evidência da existência de sincronizadores internos controlando nossas funções. Hoje já aprendemos que esses rirmos são essenciais para preservar a nossa saúde.
É importante lembrarmos que a atividade de trabalho que exercemos influencia diretamente o ritmo do nosso organismo e exige um ajuste constante dos processos internos, mas nem todas as pessoas conseguem fazer esse ajuste. Nesses casos, ocorre um desencontro entre o tempo do corpo e o tempo das atividades que a pessoa precisa executar e isto vai acumulando prejuízos à sua saúde, levando a um constante mal-estar generalizado – muitas vezes, sem uma causa aparente.
Para trabalhadores noturnos, ocorre um conflito de sincronizadores A pessoa tem que dormir quando todos os ritmos o impulsionam para a atividade do dia a dia e precisa ficar alerta quando todo o organismo o impulsiona para o repouso. Com o tempo, a tendência é acumular inúmeros problemas de saúde, sendo os mais comuns os transtornos digestivos e os problemas cardíacos.
Sabe-se que a luz artificial também tem efeitos semelhantes aos da luz natural sobre os controles internos dos nossos ritmos. Ou seja, ambas sinalizam para o nosso cérebro se é dia ou se é noite e a lógica é simples; se acendemos a luz antes do previsto – por exemplo, às 4 horas da manhã – o nosso cérebro desencadeará mecanismos para adiantar os nossos ritmos. E se prolongamos o dia, expondo-nos à luz artificial à noite, atrasaremos nossos ritmos impedindo a expressão do hormônio melatonina, pois será sinalizado para o nosso cérebro que não está escuro e que não é hora de desencadear vários processos que acontecem durante o sono noturno. Um exemplo é a expressão do hormônio do crescimento (GH), associado ao nosso sistema imunológico. Então, imagine se esse comportamento se prolongar por muito tempo, como serão os efeitos crônicos da nossa imunidade comprometida!
E qual seria a recomendação ideal de horas de sono diárias? Devemos olhar com ressalvas a quantidade de 8 horas amplamente difundida, pois esse número representa valores médios e não contempla às necessidades dos chamados grandes dormidores, que chegam a precisar de 12 horas diárias de sono.
Por outro lado, os pequenos dormidores, que têm necessidade menor de sono – entre 4 a 6 horas diárias – podem ser tratados como pessoas que sofrem de insônia, um distúrbio que pode até levar ao consumo de indutores do sono, enquanto o primeiro grupo pode ser levado a tomar drogas estimulantes. Há uma busca sem tréguas em nossa sociedade para que todos nós nos encaixemos dentro de uma normalidade irreal.
Para concluir, os sintomas que estão associados aos maus hábitos de sono são as mudanças de humor e os sentimentos depressivos. Além desses, há estudos que demonstram a relação entre sono e memória e sugerem que a incapacidade de dormir pode afetar não apenas à recuperação da memória, como também à dificuldade de aprendizado.
Por isso, preservar a qualidade do nosso sono nesses tempos em que somos expostos à iluminação e ao barulho constante, é tarefa difícil. Mas temos que nos esforçar para encontrar o equilíbrio entre os nossos afazeres e a atenção ao nosso organismo e aos nossos ritmos para preservar a saúde física e mental.
- Texto redigido pelos Profs/Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP): Eva Bettine, Thais Bento Lima da Silva e Luiz Menna Barreto