Já pensou estar realizando o seu maior sonho daqui há dois anos? Ou estar em um lugar que você nunca imaginou simplesmente porque decidiu a partir de agora?.
Foi assim, cheio de energia e em um tempo relativamente curto que a montanhista Aretha Duarte, de 37 anos, natural de Campinas, decidiu, ainda em 2019, que seria uma das pessoas a alcançar o topo mais alto da terra, o Everest, que fica a 8.848 metros do nível do mar. Aretha foi a primeira mulher negra latina a alcançar o feito e a sexta brasileira a vencer o desafio de escalar o Everest.
Até 2020, apenas 25 montanhistas do Brasil haviam conseguido chegar ao topo da montanha.
Até o momento, apenas eram cinco mulheres, nenhuma negra. Aretha chegou ao cume na manhã do dia 23 de maio, às 10h24, pelo horário nepalês (1h39 da madrugada de domingo no Brasil).
Em entrevista ao site do Método SUPERA, Aretha contou um pouco da sua história de superação, motivação e falou sobre a importância de fortalecer o corpo e a mente rumo a um objetivo, confira:
Conte um pouco sobre a sua história e quem você é?
Sou nascida, criada e ainda moro na periferia de Campinas. Aprendi desde cedo a ter responsabilidade e correr atrás dos meus sonhos. Nesses pontos, minha mãe é um exemplo desde sempre. Graças ao esforço dela, tive a oportunidade de estudar e sou a primeira da minha família a ter um diploma universitário. Me apaixonei pelo montanhismo ainda na universidade e sou guia de montanha há dez anos.
Por que escalar o Everest? Como começou esta ideia / sonho?
Até dezembro de 2019, eu não tinha interesse de escalar o Monte Everest. Achava que as pessoas queriam ir para lá, tipo, para se autopromover. Eu já tinha ido ao campo base, com mais de 5.000 metros de altitude, em 2013.
Mas, em dezembro do ano passado, vendo fotos do Carlos Santalena (sócio da Grade6) em expedições no Nepal, vi o Vale do Silêncio, que está 6.400 metros de altitude, achei impressionante e me arrepiei. Achei lindo e naquele momento quis estar lá. Assim surgiu a vontade de, um dia, voltar a escalar o Everest.
Já tinha escalado outros picos importantes?
Já pratiquei montanhismo em sete países. Antes de chegar ao cume do Everest, escalei o Aconcágua, na Argentina (cinco vezes), o ponto mais alto fora do Himalaia, e o Monte Kilimanjaro, maior montanha da África, além do Elbrus (Rússia), Monte Roraima (Venezuela), Pequeno Alpamayo (Bolívia), Vulcões (Equador), entre outros. Trabalho como guia de montanha na Grade6 e mantenho a forma física treinando no ginásio de escalada PowerBloc, em Campinas.
Como foi o tempo de preparo (quanto tempo levou)?
Tenho experiência de dez anos em montanhismo e, por conta disso, é preciso manter uma boa forma física constantemente.
Para o Everest, posso dizer que começou desde o início do projeto.
Acredito também que o processo de arrecadar e recolher resíduos para reciclagem, que garantiu 40% do valor necessário para essa empreitada, ajudou a manter um bom condicionamento.
Como treinar a questão das baixas temperaturas vivendo em um país tropical?
Essa é uma parte complexa, mas existe todo um período de aclimatação durante a subida ao Everest.
Quão importante foi o seu emocional neste processo?
Os dez anos de experiência como montanhista também contaram e eu estava muito forte mentalmente, determinada e muito focada para vencer esse desafio e realizar esse sonho.
Como você trabalhou no seu cérebro o medo de falhar ou de não conseguir? Isso passou pela sua cabeça?
Nunca pensei em desistir. Também não foquei diretamente o cume, mas um ponto de cada vez. Primeiro foi arrecadar o dinheiro para a expedição. E, nesse ponto, gostaria de agradecer todas as pessoas que me ajudaram, desde uma latinha para reciclagem aos patrocinadores.
Já no Nepal, era um passo de cada vez. Primeiro o campo base. Depois chegar a cada um dos outros campos, até o ataque ao cume.
O quão importante você acha que a sua mentalidade diante deste desafio? Como você descreveria isso?
Claro que é preciso estar bem fisicamente. Mas o lado psicológico, estar mentalmente forte, é o que faz a diferença. É o que te leva até o final. Cabeça é tudo.
Qual foi a importância de manter sua mente ativa neste processo? Como você se preparou mentalmente? Usou algum recurso específico na preparação e no trajeto? Conte um pouco sobre isso.
Usei muito o salmo 23. Quase como um mantra. Especialmente no ataque ao cume, ficava repetindo mentalmente: “O Senhor é meu pastor e nada me faltará”.
Qual foi a sensação de conseguir o feito? Como sua família e amigos reagiram?
Como montanhista, minha sensação de chegar ao cume do Everest foi de “caraca, subi de nível”. Quão difícil é escalar essa montanha. É difícil precisar tudo que sentir, pois a emoção é forte. Mas pensei sobre a minha realização e o quanto ela pode servir de inspiração para as pessoas. Para que elas entendem o poder que elas têm. E se elas conseguirem pensar, imaginar, sonhar, se tudo aquilo fez muito sentido para elas, terão a condição de realizar. É isso que eu acredito.
E para meus familiares e amigos também foi incrível, pois fazem parte dessa conquista também.
Já tem novos desafios a frente? Quais os planos para o futuro?
Chegar ao cume do Everest nunca foi o meu sonho grande. Foi um importante passo, mas meu sonho grande é colaborar com uma transformação social e ambiental nas periferias. Espero que meu exemplo ajude a agregar pessoas, entidades e patrocinadores para levantar recursos a fim de levar qualidade de vida às pessoas de baixa renda.
Por exemplo, já estamos com processo de coleta, especialmente resíduos de metais, para construir pelo menos um muro de escalada comunitário na periferia de Campinas. E quero ajudar a levar cultura, cursos, ou seja, educação, oportunidades e levantar um centro comunitários para trabalhar com reciclagem, juntamente oportunidades de cultura, lazer e esporte
Estamos em uma pandemia e muitas pessoas se sentem desanimadas em cumprir suas metas. O que diria para quem está nesta situação e até mesmo abandonou os seus sonhos por conta de tudo isso?
O que quero dizer é: nunca pare de sonhar. Acredita e trabalhe, pois é possível realizar sonhos.