Ao cantar Aquarela em 1983, o cantor Toquinho exprimiu com riqueza de detalhes todos os benefícios do desenho para o cérebro, o principal deles, a capacidade de imaginar e criar uma realidade.
Além dos bons sentimentos e lembranças – que são próprios da infância, a música confirma em palavras e notas aquilo que a neurociência já sabe: desenhar faz muito bem para o cérebro – sobretudo das crianças.
Qual é a importância do desenho para o cérebro infantil?
No contexto da infância, o desenho deve se inserir como prática diária na rotina infantil, dado o seu potencial como meio expressivo e por constituir uma das primeiras formas de identidade da criança.
“Ele permite que as crianças representem visualmente suas ideias, histórias e imaginação. Isso ajuda a desenvolver a criatividade e a capacidade de pensar sobre o ambiente que ainda é novo. Uma das primeiras habilidades desenvolvidas no cérebro infantil é a capacidade de classificação, que começam ao identificar que peixes nadam, pássaros voam, girafas têm pescoço comprido.
O desenho, então, é um forte recurso para esse desenvolvimento cognitivo de reconhecimento, classificação e identificação dos objetos do mundo. É, também, uma representação tanto figurativa (que imagina os objetos) quanto realista (como os objetos são experimentados concretamente pela criança)”, detalhou a neurocientista do SUPERA, Livia Ciacci.
Desenho e o movimento de pinça
Você já parou para pensar que as nossas crianças estão cada vez mais acostumadas a segurar o celular? Essa constância – segundo muitos especialistas, já está alterando o movimento de pinça, necessário para segurar o lápis e desenhar, o que também impacta na caligrafia. O ato de segurar um lápis, giz de cera ou pincel e criar traços no papel exige o uso de habilidades motoras finas.
O desenho ajuda as crianças a aprimorarem sua coordenação olho mão e destreza, o que é fundamental para sustentar tanto o movimento de pinça quanto o aperfeiçoamento de outros movimentos mais complexos para o ganho de autonomia, como abrir embalagens, amarrar o tênis e conseguir dosar a força ao manipular objetos.
“Quando as crianças criam desenhos e veem que são capazes de representar algo no papel, isso aumenta sua autoestima e confiança em suas habilidades, se sentindo mais motivadas a continuar experimentando e incorporando elementos, como outras cores, outros tamanhos”, detalhou a neurocientista.
O desenho no cérebro infantil
Nos primeiros anos de vida são apenas algumas linhas, a partir dos 2, 3 anos surge a apropriação progressiva das figuras geométricas e por volta dos 5, 6 anos os círculos e ovais.
O desenho mostra o funcionamento do cérebro e diz muito sobre o que e como a criança percebe o mundo em volta, trazendo à tona seu conjunto de memórias, símbolos e como está o desenvolvimento do pensamento geométrico.
Quando uma criança vê o movimento que fez com o lápis, registrado em um pedaço de papel, essa imagem retorna ao cérebro como uma representação da ação física inicial.
“Repetir movimentos semelhantes várias vezes, observando também os resultados no papel (ou em outro meio), leva à criação de um modelo mental desse movimento, quase como se fosse um “mapa” para reproduzi-lo. Esse é o princípio subjacente à aprendizagem da escrita: desenvolver mapas mentais para cada letra, sílaba e palavra”, detalhou.
Ainda segundo a especialista do SUPERA – Ginástica para o cérebro, o ato de desenhar forma, no cérebro, estruturas de redes neurais que darão suporte a muitas outras habilidades importantes posteriormente, como por exemplo:
- Narrativa – o desenho acontece como uma narrativa apoiada pela fala interna. Inclusive, as áreas da fala no cérebro são ativadas quando a criança desenha.
- Atenção – o desenho educa o foco de atenção, contribuindo para formar estruturas de atividade concentrada e, posteriormente, de atenção executiva.
- Motricidade – o desenho possibilita a integração de redes neuronais no córtex motor, nas regiões de movimentos comandados nas mãos, preensão, controle dos dedos e identificação dos dedos individualmente e em conjunto com as áreas de visão e tato.
- Emoções – além de toda parte estrutural citada, desenhar também libera neurotransmissores que causam bem-estar e diminuem a ansiedade.